Os advogados Artur Barros Freitas Osti, Filipe Maia Broeto e Pedro Henrique Marques ingressaram com habeas corpus coletivo em prol de todos presos detidos no Raio 8 da Penitenciária Central do Estado (PCE). Eles exigem a garantia dos direitos fundamentais dos presos no raio onde instalado o regime disciplinar diferenciado utilizado para a prisão de presos perigosos.
No local, também estão sendo colocados presos que antigamente ficavam no Centro de Custódia da Capital (CCC), unidade que era destinada para quem em nível superior, mas foi desmontada. O pedido está sob relatoria do desembargador Orlando de Almeida Perri, da Turma de Câmaras Criminais Reunidas. Uma liminar deve ser analisada nos próximos dias.
No pedido, os advogados apontam que a portaria que regulamenta o Raio 8 afronta diversos artigos da Constituição Federal e Tratados Internacionais no que tange ao tratamento a ser destinado aos presos. Entre elas, está o impedimento ao acesso às atividades de ressocialização, como o direito ao estudo e ao trabalho como instrumento de remição da pena a ser cumprida.
“Ninguém pode ficar enjaulado, nem mesmo um animal, 22h por dia, de forma discricionária e sem direito sequer de saber o porquê do “enjaulamento” e por quem ele foi determinado, quando a LEP, a dar efetividade aos direitos fundamentais de acesso ao trabalho e à educação, previstos no art. 6º da CF88, dedica a Sessão II inteira para garantir os direitos dos presos, seja em caráter definitivo“, diz a petição.
Não bastasse a rigidez da portaria que regulamenta o Raio 8, a situação é mais crítica, tendo em conta relato dos próprios detentos através de cartas. “É que, enquanto a Portaria assegura aos pacientes duas horas de banho de sol diárias, situação que, por si só, já causa espanto a quem goze de sua liberdade plena, os pacientes denunciam que, de fato, nem todos os dias são agraciados com essas 02 (duas) horas de cuidados mínimos com sua própria sanidade”, diz a petição.
Ainda no Raio 8, os presos também não têm direito a visita íntima da família, sendo-lhes franqueado apenas a visita social, que tem todo o seu conteúdo monitorado, feito com familiares que não podem entrar com alimentos, tendo os detentos acesso somente a “quentinha” fornecida pelo Sistema Prisional. “Assim, conclui-se que as regras de funcionamento do “Raio 08” da Penitenciária Central do Estado de Mato Grosso, disciplinadas pela Portaria, afrontam não só a própria garantia da dignidade da pessoa humana, como também as garantias previstas no artigo 5º, incisos III, XLVII, alínea “e” e XLIX, da Constituição Federal”, complementam os advogados.
Os advogados pontuam ainda que a situação se torna mais grave com presos que possuem direito a cela especial que, com o fechamento do Centro de Custódia da Capital, foram transferido para a Penitenciária Central do Estado de Mato Grosso, sendo alocados justamente no Raio onde funciona o Regime Disciplinar Diferenciado. O pedido registra que, diante da situação, tornou-se mais vantajoso renunciar ao direito à cela especial do que usufrui-lo, diante do regime imposto no Raio 8 da PCE.
“Resta inexorável, diante da situação acima narrada, que para o preso com direito à cela especial receber tratamento condigno, este deverá renunciar a sua prerrogativa de prisão especial, e, desse modo, ser retirado do Raio 8, o qual, como dito, constitui inegável RDD. Portanto, a norma neste momento atacada colide frontalmente com a direito fundamental à individualização das penas, porquanto, como dito, não observa a prerrogativa legal dos presos detentores do direito à prisão especial”, assinalam.
Além disso, a transferência do CCC para o Raio 8 da PCE já gerou a perda de direitos fundamentais dos presos com direito a cela especial. “Inúmeros presos provenientes do CCC estavam trabalhando no referido estabelecimento penal, contudo, ao ingressarem no Raio 8, perderam, abrupta e imotivadamente, o direito de laborar durante a privação de liberdade”.
PEDIDO PARA TODOS
No caso dos presos com direito à cela especial transferido para o Raio 08 da Penitenciária Central do Estado de Mato Grosso, o Habeas Corpus pede a transferência dos mesmso para outra unidade prisional onde o direito seja assegurado. Tal pedido já teve deferimento do Judiciário em relação a um dos presos no Raio 8. Na última semana, o juiz Geraldo Fidélis, da Vara de Execuções Penais, deferiu o pedido de transferência para Rondonópolis (212 quilômetros de Cuiabá) de Carlos Alberto Gomes Bezerra, filho do ex-deputado federal Carlos Bezerra (MDB), justamente pelo seu direito a cela especial. Na ocasião, Fidélis criticou o Governo pela forma como procedeu o fechamento do CCC.
“Agora, com o fechamento abrupto, sem qualquer preparação para destinação desse público, gerou uma tensão incomum, ainda mais porque o núcleo dela está no interior da maior unidade penitenciária de Mato Grosso e, como não é segredo para ninguém, basta uma fagulha para o sistema incendiar, explodindo”, afirmou.
No HC coletivo, inicialmente os advogados pediam que a portaria que regulamenta o Raio 8 da PCE fosse declarada inconstitucional. A ala, construída inicialmente para receber os líderes e facções criminosas, prevê regime disciplinar rígido, com apenas 2 horas de banho de sol por dia, visitas e conversas monitoradas e até proibição de familiares levar alimentos aos presos.
“Por todo o exposto, requer-se seja concedida medida liminar para determinar à autoridade coatora que suspenda a vigência da Portaria nº. 186/2022/GAB-SESP/SESP mantendo no “Raio 08” da Penitenciária Central do Estado de Mato Grosso as mesmas regras de funcionamento que vigoram em todos os demais, sem limitação do banho de sol, sem limitação às visitas, sem a monitoração de conversas com familiares e advogados, permitindo a entrega de alimentos aos presos em dia de visitas e, por fim, abrindo espaço para que todos, se assim desejarem, sejam incluídos em frentes de trabalho e estudo na Unidade Prisional”, diz a petição assinada no último dia 1º de fevereiro.
Porém, com a divulgação da decisão favorável a Carlinhos Bezerra, os advogados aditaram o pedido. Eles argumentam que o reconhecimento do Poder Judiciário ao direito a cela especial do filho do ex-deputado justifica a extensão do direito aos demais detidos em idêntica situação processual.
“Isso porque não se pode conferir a urgência vindicada pelo preso Carlos Alberto Gomes Bezerra, em tese, transferido do “RDD” instalado no Raio 08 da Penitenciária Central do Estado de Mato Grosso no célere prazo de 01 (um) dia a contar da data do pedido de transferência, e a retirar dos demais presos em idêntica situação fática/processual, na medida em que, nos termos do decidido pelo Juízo responsável pela decisão paradigma, a “mera possibilidade de se violar a dignidade da pessoa humana impõe ao Estado o dever de preservar a integridade física e psicológica da pessoa privada de liberdade.” Se houve urgência na preservação da integridade física e psicológica do preso agraciado com a decisão de transferência paradigma, ao menos ao viso defensivo, ela também haverá de existir na preservação dos direitos de todos os pacientes dessa impetração.”
Fonte: FolhaMax